sábado, 10 de junho de 2017

O circo judiciário brasileiro

Por Fernando Castilho


Imagem: Internet


Gilmar aposta todas as suas fichas que o governo Temer está inviabilizado por ter somente 3% de aprovação, pela possível debandada do PSDB e, principalmente porque a Globo quer a renúncia do golpista.

O assunto é bastante complicado. Parece um jogo de xadrez ou um quebra-cabeça. Mas vamos lá pela ordem cronológica dos acontecimentos.

Logo após as eleições de 2014 o TSE presidido por Gilmar Mendes, após analisar as contas da chapa Dilma-Temer, diplomou presidenta e vice com ressalvas que não chegaram a comprometer a lisura do pleito.

Mas o PSDB, presidido pelo candidato derrotado, Aécio Neves, entrou com ação no TSE alegando abuso de poder econômico da chapa vencedora. Aécio, pego recentemente em uma gravação, afirmou que tomou essa decisão somente para encher o saco (sic). Ou seja, não tinha nenhuma esperança de que a chapa fosse cassada e também não imaginava que num futuro próximo se aliaria ao vice Michel Temer quando este assumisse o lugar de Dilma no golpe que ocorreria dois anos mais tarde.

Dilma sofreu impeachment com o aval do ministro do STF, Ricardo Lewandowski, sem que ela tivesse cometido crime de responsabilidade, vale ressaltar.

Porém, Lewandowski, vergonhosamente, por vias indiretas, reconheceu a inocência de Dilma ao manter seus direitos políticos.

Teoricamente, pelas leis brasileiras, a aprovação das contas da chapa seriam processo transitado em julgado e não deveria mais ser objeto de discussão e reanálise. Deveria, mas não foi.

Com o pretexto de que fatos novos vieram à tona devido principalmente às delações da Odebrecht de que houve contribuições à campanha não contabilizadas, o chamado caixa 2, Gilmar Mendes levou a ação do PSDB adiante.

Os tucanos, agora apoiando Temer, tentaram desistir da ação ou separar a ação em duas. Queriam absolver Temer e condenar Dilma (que já não estava mais no governo). Não deu.

Após as gravações de Joesley Batista da JBS que incriminam Temer terem vindo à tona,a Globo passou a exigir a renúncia do presidente golpista mas este se nega a deixar o governo, confiante de que dará a volta por cima e levará adiante as reformas trabalhista e da previdência. Isso sem considerar sua pífia aprovação de 3% de seu governo.

A esquerda foi às ruas e passou a exigir, caso Temer renunciasse, eleições diretas já. A Constituição prevê em caso de vacância do cargo, eleições indiretas. Por isso seria necessária uma emenda à Constituição.

Portanto, com o julgamento marcado para decidir pela cassação ou não da chapa, colocamo-nos numa situação muito interessante.

A esquerda desejava a cassação da chapa porque desta forma Temer sairia do governo e o caminho poderia se abrir para as diretas já. Isso não afetaria Dilma já que ela não está mais no poder.

Então, caso a chapa fosse cassada, o reconhecimento público de que na campanha da chapa Dilma-Temer houve mesmo abuso de poder econômico colocaria Dilma em situação constrangedora.

Logicamente não há como chamar Dilma de desonesta, uma vez que os candidatos, sejam eles a própria Dilma, Temer ou até mesmo Aécio NÃO SE OCUPAM DA TAREFA DE MEXER COM DINHEIRO DE CONTRIBUIÇÕES, cabendo aos tesoureiros de campanha esta função. Mas também não há como negar que a responsabilidade atinge sim os candidatos.

Além disso, como lembrou o Ministro do STE, Napoleão Nunes, em seu voto, caso a decisão fosse pela cassação, em respeito à Democracia, certamente o beneficiário seria Aécio Neves, o segundo colocado no pleito. Seria ele então conduzido, mesmo que tenha hoje 0% nas pesquisas para 2018, à presidência!

A votação no STE terminou em 4 a 3 para a manutenção da chapa. O voto de minerva foi dado por Gilmar Mendes.

Ora, por que Gilmar Mendes votou pela absolvição da chapa? Justamente por causa da lembrança do ministro Napoleão.

Embora Gilmar seja muito amigo de Aécio, neste momento ele não deseja vê-lo na cadeira da presidência porque ele próprio, Gilmar está de olho nela.

Gilmar aposta todas as suas fichas que o governo Temer está inviabilizado por ter somente 3% de aprovação, pela possível debandada do PSDB e, principalmente porque a Globo quer a renúncia do golpista.

Gilmar acredita que nas eleições diretas seja ele o eleito à presidência.
A busca incessante dos holofotes, inclusive nos últimos 4 dias em que travou uma batalha com o ministro Herman Benjamim, deixa claro que Gilmar está em campanha.

E poderá realmente vencer no Congresso.

Porém, há ainda uma pequena coisa a considerar.

Como a chapa saiu inocentada, há ainda a possibilidade, remota que seja, do cancelamento do impeachment, o que conduziria Dilma de volta ao seu lugar.

Tecnicamente, mas não politicamente, isso é possível.

Fica uma chata lição aos brasileiros que assistiram ao espetáculo de 4 dias do TSE.

O prédio é pomposo, os ministros com suas togas são seres que se julgam deuses muito vaidosos e os julgamentos são cartas marcadas.

Mas não nos deixemos enganar. Trata-se de um circo cuja estrela maior é um palhaço muito perigoso.


terça-feira, 6 de junho de 2017

E se já deu tudo errado?

Por Fernando Castilho



Imagem: Meme publicado na Folha


Assim como os alunos do colégio, o prefeito se veste quase que diariamente de gari, guarda de trânsito e até de cadeirante sem que os brasileiros de Sampa se indignem com isso.


Ficamos, alguns, claro, perplexos com uma festa organizada por um colégio evangélico do Rio Grande do Sul, para os alunos do terceiro ano do Ensino Médio, cujo tema foi “E se nada der certo?”.

O tema foi criado, segundo a escola, para instigar estudantes sobre as opções em caso de reprovação no vestibular, convidando os alunos a se fantasiarem com trajes de profissões ou atividades que considerariam como possibilidade se os planos "dessem errado". Entre as opções elencadas pelos adolescentes estavam vendedores, faxineiros, ambulantes, mecânicos, cozinheiros e garçons.

Ora, o tema se coloca nos dias de hoje, como muito apropriado, diria até, em consonância com os rumos que o país está adotando, guiado pelos seus governantes.

Tudo começou após junho de 2013 quando a presidenta Dilma despencou de confortáveis 65% de aprovação para 30% apenas.

Uma parte dos brasileiros, a chamada elite que mandou no país desde seu descobrimento e que foi responsável pelo golpe militar e pelos 21 anos de escuridão democrática, xingou Dilma de “vaca” e a mandou TNC durante a abertura da Copa do Mundo.

No mesmo dia em que a presidenta conseguiu sua reeleição, esses mesmos brasileiros, liderados por um irresponsável passaram a exigir seu impeachment, desrespeitando a Democracia, a Constituição e o Estado de Direito.

Dilma sofreu um golpe e com ele o Brasil, governado por uma quadrilha liderada pelo vice traidor, Michel Temer que começou a afundar o país numa crise sem precedentes.

Temer foi pego em flagrante tratando de corrupção. E esses brasileiros agora só querem sua renúncia porque a Globo está pedindo. Mas não querem eleição direta.

O ídolo dessa gente, Aécio Neves, também foi pego em gravações, mas ao contrário do que o senso comum poderia esperar, esses brasileiros não admitem que foram enganados, não exigem sua prisão e nem reconhecem que foram responsáveis pelo estado crítico da ética em que estamos envolvidos.

Dilma não foi retirada por corrupção, mas sim, porque ela é do PT.

Poupam Aécio porque ele é tucano. Simples assim.

Por outro lado, a cidade de São Paulo elegeu um prefeito que se diz gestor e não político.

João Doria, logo no início de seu mandato, foi desmascarado como devedor do município com uma dívida de 90 mil reais de IPTU! Sem graça, teve que pagar.

Assim como os alunos do colégio, o prefeito se veste quase que diariamente de gari, guarda de trânsito e até de cadeirante sem que os brasileiros de Sampa se indignem com isso. Trabalhar mesmo que é bom, nada.

Além disso, o prefeito se meteu numa aventura daquelas cuja consequência não se conhece. “Acabou” com a cracolândia, espalhando-a por todo o centro da cidade. Como se não bastasse, percebendo a enrascada inconsequente em que se meteu por puro desconhecimento do delicado assunto, decidiu internar os dependentes à força, no que foi barrado pela Justiça. A situação permanece indefinida, sem solução, mas os brasileiros paulistanos já lhe concederam 80% de aprovação pela sua “política” na cracolândia.

Esses mesmos brasileiros de Sampa já o colocam numa pesquisa à frente de Lula para a presidência!

Por fim, a cereja do bolo.

Doria teve sua carteira de habilitação suspensa por somar mais de 20 pontos e acumular grande valor de multas entre 13 de janeiro e 12 de março ao dirigir seus Porsche, Audi e BMW. Como ainda não fez o curso de reciclagem, continua sem carteira.


Querem mais? Ele ainda tentou se justificar dizendo que perdeu o prazo para transferir a pontuação! Isso não é corrupção? 

Mas quem se importa?

Esses brasileiros de que falo?

A ética se inverteu neste país faz tempo.

Agora os corruptos, os que se saem bem, os que passam por cima dos demais para conseguir sucesso na vida são os admirados por essa gente.

Uma nova geração está sendo educada em caros colégios com esses valores.

Já deu tudo errado, minha gente!


sábado, 3 de junho de 2017

O MPF quer condenar Lula sem provas? Dentro do Estado de Direito?

Por Fernando Castilho








Acordamos hoje com uma notícia assustadora: as alegações finais do Ministério Público Federal pedem a condenação de Lula.

Seria perfeitamente normal se não levássemos em consideração o que o órgão afirma nas alegações.

Segundo o advogado de Lula, Dr. Cristiano Zanin Martins, os procuradores afirmam que “a solução mais razoável é reconhecer a dificuldade probatória” (pág. 53) e pedem a condenação sem provas.

Ora, os procuradores reconhecem a dificuldade em provar o ilícito por isso pedem uma condenação sem provas? Para onde foi o Estado de Direito?

Isso se traduz como lawfare, a tese de que uma pessoa pode ser condenada somente por perseguição política.

A Folha publicou logo cedo:
A Procuradoria pede condenação à prisão, em regime fechado. Além disso, solicita a Sergio Moro que o ex-presidente pague R$ 87.624.971,26, que seria "correspondente ao valor total da porcentagem da propina paga pela OAS".

Salvo engano, aquele tríplex do Guarujá vale pouco mais de um milhão de reais, portanto, essa multa é totalmente desproporcional e descabida.

Ainda, segundo a Folha, o chefe dos procuradores da força tarefa, Deltan Dallagnol, afirmou que Lula é apontado como o responsável "pela promoção e pela organização do núcleo criminoso que se instaurou no seio das empresas do Grupo OAS, assim como pelo comando das atividades criminosas por meio delas perpetrados”.

É no mínimo bizarro constatar, através das últimas notícias que dão conta da corrupção praticada por Michel Temer, Aécio Neves, toda a cúpula do governo federal, governadores de estado, deputados e senadores, que Lula seria o comandante dos crimes.

Dallagnol comete outro grave atentado ao Estado de Direito quando afirma que diante "de um dos maiores casos de corrupção já revelados no país", é preciso afastar "a timidez judiciária na aplicação das penas quando julgados casos que merecem punição significativa".

Afastar timidez judiciária? O que é isso?

O dr. Zanin salienta em seu twitter que o MPF em suas alegações finais não pediu a prisão de Lula como o G1 e a Folha publicaram. Mas é claro que dá no mesmo, afinal, eles querem a condenação.

Até o dia 20 de junho será a vez da defesa de Lula entregar a Moro suas alegações finais.
Por toda ousadia do MPF (não só falta de timidez) e de Moro que tem se colocado nos depoimentos como mais um membro do MPF e não como juiz equidistante das partes, ficaria dada como certa a condenação de Lula em primeira instância.

Ocorre que Moro vem tendo sua imagem desgastada nos últimos tempos devido à sua perseguição contra Lula e a soltura de Cláudia Cruz mesmo com todas as provas contra ela.

O Estadão recentemente publicou um editorial atacando o juiz.

Além disso, Moro será julgado pelo CNJ em julgamento que foi adiado.

Leia mais sobre as dificuldades que Moro atravessa neste artigo.
Diante disso, fica difícil fazer um exercício de antecipação da decisão de Moro.

Ele tem que medir muito bem seu julgamento pois sabe que em caso de condenação de Lula em primeira instância, ainda mais com todo esse movimento Fora Temer! E Diretas Já!, esse pode ser o estopim de uma convulsão social sem precedentes nas últimas décadas.

Será que ele corre o risco?





sexta-feira, 2 de junho de 2017

Por que sindicatos e partidos não são bem-vindos?

Por Fernando Castilho


Foto: Paula Lavigne



Há dois movimentos: o Fora Temer e o Diretas Já. Não devemos confundir o movimento com um show apenas.
Quem faz isso é a Força Sindical no 1° de maio, quando até sorteia carros.



A primeira nota que saiu foi a do Estadão. A organização do evento dos artistas afirmava que a manifestação de domingo deveria estar isenta de sindicatos e de partidos porque agora seria hora aglutinar outras pessoas em torno do Fora Temer.

Isso significava que os artistas achavam que água e óleo não se misturam, leia-se, camisetas vermelhas com verde-amarelas.

Imediatamente a esquerda nas redes sociais se dividiu. A maioria repudiou a decisão da organização. Mas grande parte defendeu os artistas e outros alegaram que era invenção do jornal.

Mas a Folha divulgou a mesma coisa.

Antes disso, um amigo me passou por What'sApp um vídeo em que o senador Randolfe da Rede conversava com Caetano e amigos na casa do último.

Começou a haver uma certa briga entre a esquerda. Se a intenção era essa, não sabemos.

No dia seguinte a organização afirmou que foi um mal entendido e que a manifestação não era apartidária.

Paula Lavigne organizou em sua casa uma reunião com artistas regada a vinho e queijos. a matéria saiu na Veja. Embora não tenha sido divulgado, há fontes que afirmam que o assunto principal teria sido uma espécie de fechamento de questão em torno do nome de Marina Silva para as Diretas Já. Letícia Sabatella, petista antiga, participou da reunião mas nada se falou de sua posição.

Sabemos que em todas as manifestações contra as reformas a Rede nunca esteve presente. Muito menos Marina Silva.

Sabemos também que a moça defende as reformas trabalhista e da previdência. E não adianta vir com a história de que teriam que ser melhor estudadas.

Nunca Caetano e outros monstros sagrados como Milton Nascimento se manifestaram contra as reformas.

Nas manifestações das quais participei na Av. Paulista, nos carros de som havia artistas mais ou menos desconhecidos mas nunca os medalhões deram a graça de sua presença.

Em um show de Caetano há alguns meses, foi o público quem levantou o Fora Temer e ele ficou sem graça de proibir. Caetano apoiou Marina em 2014.

Já Milton apoiou e fez campanha para Aécio. Aí, aparece de repente em Copacabana.

Caetano e Paula Lavigne foram aqueles que proibiram a biografia de Cae.

Dizem que Chico Buarque não compareceu ao ato em Copacabana por causa do problema de saúde da filha. Já não sei mais se foi por isso.

O fato, para encerrar, é que há dois movimentos: o Fora Temer e o Diretas Já. Não devemos confundir o movimento com um show apenas.

Quem faz isso é a Força Sindical no 1° de maio, quando até sorteia carros.

Posso estar sendo duro mas exponho o que penso. Críticas serão bem-vindas.

O movimento é político, muito mais que artístico.

E pelo menos por enquanto ainda não é Marina Já.

Caetano e Milton, vocês são nossos ídolos desde sempre. Não dá pra esquecer suas músicas. Só suas músicas.


Pode Lula fazer mais?

Por Fernando Horta

Imagem: GGN


Por Fernando Horta: Lula, se puder concorrer e se ganhar a próxima eleição, terá o maior desafio que um presidente brasileiro já teve. Reorganizar um país que está quase tão destruído quanto uma guerra civil deixaria.

O discurso de Lula no congresso nacional do Partido dos Trabalhadores, na quinta passada, foi mais curto e errático do que costuma ser. A verdade é que o ex-presidente sente o peso que hoje tem, como única figura de esquerda capaz de barrar o avanço conservador. O partido tenta dar-lhe ao mesmo tempo apoio e abrigo. Não é pouco o que Lula enfrenta. Afora uma caçada midiática diuturna, Lula ainda lida com o lawfare da República de Curitiba e seus experts em Powerpoint, pedalinhos e documentos sem assinatura. A perda de dona Marisa Letícia (homenageada no Congresso) e o constante assédio aos familiares do ex-presidente completam um quadro nefasto que o líder, de 70 anos, impressiona ao enfrentar de forma tão aguerrida.

Não há outra alternativa, dirão alguns. Eu discordo. Existem outras alternativas para Lula, talvez não para a esquerda brasileira neste momento. Para piorar as coisas, Guilherme Boulos escreve afirmando que Lula não unificará as esquerdas “fazendo mais do mesmo”. Permita-me discordar meu caro Boulos, diante da atual situação, mais do mesmo de Lula estaria já de muito bom tamanho. Tentam incitar o ex-presidente a um caminho de maior acirramento, de maior enfrentamento. Tentam fazer do Lula de 70 anos um lutador por reformas de base que lula não foi com 50 ou 60.

Lula, em parte, aceita o desafio. Parte do discurso na noite da quinta-feira passada foi dirigido a ataques à Rede Globo. É compreensível que o ex-presidente esteja magoado. As vilanias da Globo são conhecidas desde a destruição de Assis Chateaubriand e a consolidação do império dos Marinho durante a ditadura. Mas parece que a Globo perdeu a finesse com a morte do seu fundador. Os atuais donos perderam o senso de tempo e oportunidade e estão gastando seu capital político de forma muito acelerada. O custo dos ataques a Lula tem subido vertiginosamente e pode ser visto nas pesquisas eleitorais e na má vontade de vários anunciantes da Globo que já percebem prejuízos aos seus produtos por conta da postura política da emissora.

Lula tem sido cobrado a fazer as reformas estruturais que a esquerda há muito pede. Na última noite, Lula lembrou que presidente com sessenta parlamentares não faz reforma. Com 70 anos, Lula ainda tem que dar aula de política para uma parte da esquerda que parece viver no Sítio do Pica Pau Amarelo (ou vermelho, se preferirem). Um lugar onde o chefe do executivo tem o pó de pirlimpimpim e é capaz de realizar tudo o que pensa. Sozinho. Se faz aliança é por puro interesse, e se a aliança é com políticos de duvidosa moral então a aliança é fisiológica, nefasta. Lula lembra que se faz aliança não com quem se quer, mas com quem ganha eleição. Partidos que nunca ganharam nada no executivo costumam esquecer-se disto.

Sem um parlamento capaz de fazer mudanças, Lula não poderá fazer muita coisa.
Enquanto as bancadas de latifundiários, banqueiros e industriais forem imensamente maiores que as de trabalhadores, professores e camponeses Lula só fará algo se propuser o “mais do mesmo”. Colocando na mesa seu imenso poder de negociação e chamando as forças políticas para um grande pacto nacional. De novo. E não me entendam mal, isto, hoje, já seria excepcional. O problema é que a esquerda ferida pensa que a eleição de Lula seria uma reversão de forças. Teria a capacidade de devolver todo o mal que tem sido infligido a ela. Fala-se em “punir os golpistas”, num misto de devaneio com esquizofrenia.

Lula não pode tudo. Nunca pode, a bem da verdade. Governar não é um exercício solitário da vontade. Tivemos algumas vezes presidentes eleitos com minoria no congresso. E congresso hostil ainda. Vargas em seu último mandato é um exemplo claro. A guinada à esquerda de Vargas não surtiu efeito. As pressões eram demasiadas. Terminou como sabemos. Um tiro no peito, o levante do povo e a continuidade do modelo populista por mais dez anos.

A verdade é que a esquerda brasileira é profundamente incompetente. Não conseguiu construir alternativas eleitorais factíveis durante todo o período que esteve no poder. E não falo apenas do PT, mas de toda a esquerda. Quem bate no peito e exige “autocrítica” não é capaz de fazer a sua e perceber que sem Lula e sem o PT não existe esquerda brasileira hoje. E o pior é que sequer esta avaliação realista são capazes de fazer. Continuam com discursos agressivos, rompantes revolucionários sem sentido e cobranças anacrônicas.

Lula, se puder concorrer e se ganhar a próxima eleição, terá o maior desafio que um presidente brasileiro já teve. Reorganizar um país que está quase tão destruído quanto uma guerra civil deixaria. E sem base legislativa temo que Lula pouco ou nada possa fazer. Alguns dirão que é culpa do próprio Lula e que ele tem a obrigação de fazer a reforma A ou B. Eu me recordo de Churchill, durante a Segunda Guerra, informando a Roosevelt e Stalin que o Papa exigia que se libertasse Roma primeiro e que se protegesse todo o local da Santa Sé. Stalin perguntou: “Quantas divisões comanda o Pontífice?”

Quantas cadeiras no congresso comanda esta esquerda que está a exigir tantas “reformas” do ex-presidente?


50 anos (and counting) de Sgt. Pepper's

Por Fernando Castilho


Imagem: EMI



50 anos de um álbum que revolucionou o rock definitivamente!

Ontem comemoramos 50 anos do lançamento nos Estados Unidos do icônico álbum Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band dos Beatles.

É interessante constatar que, apesar de toda a imprensa falar sobre isso e de vários artigos terem sido escritos para lembrar o evento, para os jovens atuais, o significado passa desapercebido.

Ontem mesmo, saí com meu sobrinho em seu carro. O rádio estava ligado e foi inevitável ouvir as músicas que ele mais ou menos curtia.

Mais ou menos por que?

Porque até ele mesmo não gosta, ou melhor, não ama as músicas que ouve.

John Lennon diria: The sound you hear is muzak to my ears.

Essa é a diferença. Nós, da minha geração e da posterior, amávamos e ainda amamos as músicas dos Beatles. E queremos sempre ouvi-las.

Não se trata de saudosismo. As músicas que os jovens de hoje ouvem não têm nem de longe as letras bem trabalhadas dos Beatles, isso quando não são grosseiras recorrendo a palavrões de forma gratuita.

As harmonias praticamente não existem e a melodia é extremamente simplória, recorrendo a vários lugares-comuns.

Os Beatles entraram no estúdio para gravar Sgt. Pepper's em novembro de 1966 e só concluíram o disco quase 7 meses depois!

Que gravadora hoje em dia disporia um estúdio para uma banda gravar um disco durante 7 meses?

Nesse período os Beatles, após terem encerrado a fase de turnês, decidiram aprofundar o experimentalismo iniciado em Rubber Soul e Revolver.

Lembremos como:

Entraram instrumentos inusitados para o rock como cítaras e cravos.

As harmonias passaram a ser trabalhadas de forma complexa e original.

Os Beatles aprenderam a tocar piano.

As letras passaram a ser menos bobinhas e agora passavam a testemunhar o dia a dia na vida das pessoas retratado pelas notícias de jornal, além de reminiscências de um passado ainda não longínquo vivido por eles em sua infância.

George Martin percebeu que poderia dar uma chance à criatividade da banda que desabrochava e decidiu que era hora de dar vazão a arranjos de maior qualidade.

George Harrison aprimorou sua técnica na guitarra.

Paul e John nunca tinham cantado tão bem antes.

E Ringo dá um verdadeiro show em A Day in The Life.

Já não eram mais os antigos e puros rapazes de Liverpool. Tinham amadurecido musicalmente.

As inovações não pararam por aí.

Pela primeira vez os membros de uma banda não apareciam sozinhos na capa de um disco. Na foto há, além deles e de seus clones em cera, fotos das mais variadas personalidades, desde Karl Marx até Edgar Allan Poe, passando por Bob Dylan e Mick Jagger.

Não contentes com isso, publicaram na contra capa as letras das músicas.

O disco veio num encarte onde era possível recortar bigodes e colocá-los onde se quisesse.

Uma verdadeira revolução, enfim.

Meu sobrinho e os jovens que ouvem as músicas de hoje sequer imaginam a mágica que sentíamos acontecer cada vez que olhávamos aquela capa e ouvíamos o disco. Eles perdem.

E não adianta dizer: ei, ouça isto! Você vai gostar!

Beatles não é para se ouvir uma vez e sair gostando. Afinal, os ouvidos de hoje estão desabituados ao que é bom. É preciso paciência e ouvir várias vezes para reeducá-los.

Foi assim com um ex-aluno meu que aos 15 anos foi fisgado pelos Beatles.

À primeira vista aquele som não impressionou muito mas como ele tinha conhecimento da importância histórica da banda, concluiu que, se todo mundo até hoje ainda fala de Beatles é porque deveria ser bom.

Não levou muito tempo para que ele, ao contrário de seus amigos, se tornasse um tardio beatlemaníaco que sabe hoje mais que eu sobre o conjunto.

Os Beatles são assim. 46 anos após a extinção do grupo, ainda são capazes de fisgar as novas gerações.

I read the news today, oh boy: "Sgt. Pepper's forever!"




quarta-feira, 31 de maio de 2017

Quando a Justiça enoja: três anos de cadeia por furtar ovos de páscoa e um quilo de frango

Por André Forastieri





Por André Forastieri em seu blog.
É lugar comum dizer que o Brasil precisa de reformas. Mas reformas são leis, e leis dependem de aplicação, e isso é feito por seres humanos, juízes. No Brasil, muitos juízes aplicam as leis como bem entendem. É a velha piada que advogados contam: “de cabeça de juiz e bunda de nenê, nunca se sabe o que vai sair.”


O bebê é pequenininho, menos de um mês. Nasceu na cadeia e lá vive com sua mãe. A cela tem capacidade para doze pessoas, mas está ocupada por 18 lactantes. A mãe cumpre pena por furtar ovos de páscoa e um quilo de peito de frango. Foi condenada a três anos, dois meses e dois dias por esse crime.

A defensoria pública de São Paulo pediu um habeas corpus na última sexta-feira. Acionou o Supremo Tribunal de Justiça para pedir a anulação do crime, por ser insignificante; a readequação da pena; ou a prisão domiciliar, garantida pela leis às mães responsáveis por filhos menores de 12 anos.

O argumento é que a sentença é desproporcional à tentativa de furto e que a mulher é mãe de mais três crianças, de 13, 10 e 3 anos de idade. Além do bebê, que será separado da mãe quando completar seis meses. As quatro crianças crescerão longe da mãe, se ela seguir cumprindo pena na Penitenciária Feminina de Pirajuí, no interior de São Paulo.

O ministro do STJ, Nefi Cordeiro, negou o pedido da Defensoria e manteve a pena da mãe em regime fechado. Determinou que ela deva cumprir toda a pena na prisão por causa de “circunstâncias judiciais gravosas”. Disse “não vislumbrar a presença dos requisitos autorizativos de medida urgente.”

Quem é Nefi Cordeiro? Curitibano, oficial da PM, formado pela Federal do Paraná. Tem duas medalhas concedidas pelas Forças Armadas, a do Pacificador e Ordem do Mérito Militar. Foi nomeado para o STJ por Dilma Rousseff.

Nefi Cordeiro determinou em julho de 2016 a soltura de Carlinhos Cachoeira, Fernando Cavendish (da Construtora Delta), e de Adir Assad e Cláudio Abreu. Presos na Operação Saqueador, eles são acusados de integrar um esquema que lavou R$ 370 milhões de reais de dinheiro público.

Nefi Cordeiro confirmou em 2015 uma condenação por tráfico de duas gramas de maconha – isso mesmo, duas. É o menor caso de condenação por tráfico já registrado. A pena foi de quatro anos e onze meses. O tráfico aconteceu 15 anos antes, em 2000, em Cataguases, Minas Gerais.

Nefi Cordeiro concedeu habeas corpus a quatro PMs cariocas que fuzilaram com 63 balas um carro com cinco jovens inocentes, matando Roberto, de 16 anos, no caso que ficou conhecido como Chacina de Costa Barros. No dia 7 de julho de 2016, a família disse que após o habeas corpus, a mãe de Roberto, a cabelereira Joselita, morreu “de tristeza”.

É lugar comum dizer que o Brasil precisa de reformas. Mas reformas são leis, e leis dependem de aplicação, e isso é feito por seres humanos, juízes. No Brasil, muitos juízes aplicam as leis como bem entendem. É a velha piada que advogados contam: “de cabeça de juiz e bunda de nenê, nunca se sabe o que vai sair.”

Nunca se sabe, mas todos sabemos que a justiça brasileira frequentemente tarda e falha, e tarda e falha especialmente quando o acusado tem dinheiro. A estrutura de senzala do Brasil está tão integrada à nossa sociedade que ninguém estranha que haja prisão de luxo para quem tem diploma universitário, e de lixo para quem não teve dinheiro para estudar. Como ninguém estranha o elevador de serviço, a diferença da cor de pele entre ricos e pobres, 60 mil assassinatos anuais, ou o fato de metade dos brasileiros não terem esgoto em casa.

Nunca houve justiça no Brasil e não haverá tão cedo. Como nunca houve democracia e não haverá tão cedo. Temos pouca experiência com uma e outra. Esse é o fardo histórico que todo brasileiro tem que carregar, bestas de carga, deitados eternamente em berço esplêndido.

Mas Justiça é um tema cada vez mais central na vida de todos nós. Porque a natureza da sociedade abomina o vácuo. Então o Judiciário vem preenchendo – correta e incorretamente, com moderação e com messianismo - o vazio deixado pelo Executivo e Legislativo, que há tempos abdicaram de nos representar. E seguem ignorando solenemente desejos e necessidades da maioria, e enchendo os bolsos numa lambança sem fim, como nos informa todo dia o noticiário.

Mas membros do executivo e legislativo podem perder o emprego. Juízes não. É mais fácil arrancar uma presidente eleita por 53 milhões de votos do seu cargo que demitir um juiz do supremo tribunal de justiça.

Talvez antes de qualquer outra reforma, o Brasil precise de uma reforma profunda no Judiciário. Que o torne ágil e transparente, potente e permeável à fiscalização da sociedade.

Que dê alguma credibilidade a um poder que mantém na cadeia uma mãe miserável que furtou frango e ovo de páscoa, mas concede a prisão domiciliar a Adriana Ancelmo, esposa e comparsa do ex-governador, casal que fez fortuna com a miséria dos mais miseráveis cariocas - exatamente a gente que, no limite, furta comida.

Não se trata de “cortar as asas” do Judiciário, sonho da curriola de políticos e empresários que se organiza para fugir de investigações e delações. Se trata de tratar de maneira mais equânime os ladrões da esquina e os ladrõezões de terno e gravata.

Essa semana a polícia paulistana prendeu com grande balbúrdia traficantezinhos na Cracolândia. Também esta semana, o Supremo Tribunal Federal condenou Paulo Maluf a sete anos de prisão por lavagem de dinheiro que ocorreu no seu mandato de prefeito, entre 1993 e 1996. Finalmente Maluf vai pra cadeia? Não, ainda há espaço para recurso, mais de trinta anos depois do roubo cometido...

O juiz é um funcionário público como qualquer outro. Eles têm que ser tratados de acordo. Trabalham para nós. Têm que responder para nós. E, se for o caso, serem corrigidos, ou até punidos por nós. Nossa Justiça, e ausência dela, e revisão profunda do que significa justiça no Brasil, é pauta urgente e bem mais importante do que quem vai sentar no Palácio do Planalto nos próximos meses.


Mas alguns casos, algumas pessoas, talvez estejam além da capacidade da sociedade brasileira de corrigir seu rumo. A decisão de Nefi Cordeiro que mantém uma mãe de quatro filhos na cadeia, por furtar frango e ovo de páscoa, é incompreensível para nós. Está em outro domínio. O do inimaginável, do inumano, além da imoralidade, além da redenção.

terça-feira, 30 de maio de 2017

Moro chega ao fim?

Por Fernando Castilho


Imagem: Internet


Michel Temer, ao nomear o juiz Torquato Junior, homem crítico à Lava Jato, para o ministério da Justiça deixa apreensivos o Ministério Público e a Polícia Federal que temem pela redução de verbas para os órgãos e pelo desmantelamento da operação, o que seria muito útil para o presidente.



Algumas coisas que acontecem, aparentemente são desconexas mas se pararmos para refletir, veremos que, se alinhavadas de alguma forma, podem fazer sentido.

Refiro-me ao juiz Sérgio Moro.

Todos conhecemos e acompanhamos a saga de Moro que, já durante 3 anos tenta incriminar Lula nos casos do tríplex no Guarujá, do sítio em Atibaia e da guarda dos presentes que ganhou durante o tempo em que permaneceu na presidência.

Moro iria ser submetido a julgamento neste dia 30 de maio pelo CNJ por ter vazado ilegalmente áudio entre Lula e Dilma sem a autorização do STF.

Além disso, outro áudio envolvendo uma conversa entre Marisa Letícia, esposa falecida de Lula e seu filho, sem que o diálogo dos dois tivesse qualquer ligação com as investigações da Lava Jato, também vazou para a imprensa.

O julgamento foi adiado.

Moro recentemente ouviu Lula em depoimento.

As opiniões se dividiram.

Boa parte das pessoas assistiram trechos editados pela Rede Globo no Jornal Nacional e ficaram com a impressão de que Moro (que não devia atuar como acusador, mas manter-se equidistante das partes) venceu a “contenda”.

Mas quem assistiu às 4 horas e meia do depoimento, deve ter percebido o apuro que o juiz sofreu após ouvir a defesa e as reclamações do ex-presidente quanto à operação.

Em seguida, a Polícia Federal pediu arquivamento da acusação de que Lula teria recebido como propina a guarda dos objetos recebidos como presente.

Quando Eduardo Cunha fez, em seu depoimento, 41 perguntas a Michel Temer, Moro só aceitou respostas para 21.

Logo depois viria a revelação da gravação feita por Joesley Batista, da JBS, de sua conversa com Temer. Joesley deu a entender que dava mesada para Cunha já há algum tempo, ao que Temer respondeu: tem que manter isso, viu?

A Globo investiu pesado contra Temer e Aécio Neves e a primeira lembrança que veio à nossa mente foram aquelas fotos de momentos felizes vividos por Moro, Aécio e Temer.

Será que Moro não teria como saber dessas mesadas?

Em seguida viria a surpresa maior. Moro inocentou Cláudia Cruz, esposa de Cunha, afirmando que não havia provas contra ela, mesmo que extratos tivessem sido enviados de banco na Suíça. Além disso, Moro determinou que Cláudia devolvesse 500 mil da propina, prova de que houve crime. A opinião pública começou a balançar. Desconfia-se que Moro tenha rabo preso com Cunha.

Como se não bastasse, surgiu a revelação de que a esposa de Moro teria envolvimento com uma máfia que desviava recursos das APAE's do Paraná. Moro parece cada vez mais desacreditado.

Ontem, 29, a auditoria da KPMG inocentou Lula de participação no esquema de corrupção da Petrobras, um choque para Moro, com certeza.

Michel Temer, ao nomear o juiz Torquato Junior, homem crítico à Lava Jato, para o ministério da Justiça deixa apreensivos o Ministério Público e a Polícia Federal que temem pela redução de verbas para os órgãos e pelo desmantelamento da operação, o que seria muito útil para o presidente.

Então, agora alinhavando.

Provavelmente se Moro tivesse sido julgado hoje pelo CNJ, seria absolvido ou no máximo, advertido pois o relator é um admirador seu.

O fato seria noticiado mas não teria grande repercussão.

Porém, ao ser adiado o julgamento, transparece uma possibilidade de que o próprio Temer esteja por trás disso. Lembremo-nos de que Cármem Lúcia é presidente do CNJ e recentemente se reuniu com Temer.

Temer pode estar tentando ganhar tempo para que surja mais alguma coisa contra Moro e este venha, quando for julgado, condenado a uma pena, mesmo que pequena, o que o tiraria do comando da Lava Jato, entrando alguém mais palatável ao presidente.

Não é de hoje que temos a impressão de que Sérgio Moro, assim como Michel Temer, foram peças muito úteis ao golpe, mas que agora podem ser descartadas.

A ver.


segunda-feira, 29 de maio de 2017

Sr. Doria, São Paulo não é uma padaria!

Por Fernando Castilho

Foto: Nilton Fukuda



Serão os dependentes internados num estabelecimento, à semelhança dos antigos manicômios, destinados somente a retirar de circulação e da vista de todos pessoas, feias, sujas e miseráveis?

João Doria Jr. foi eleito prefeito da cidade de São Paulo com a promessa de, ao invés de fazer política, ser um gestor.

Obviamente, Doria, como todo empreendedor de visão, captou que o mercado de eleitores estava cansado de seus governantes metidos em negócios escusos com denúncias e delações surgindo a todo instante e que havia um nicho importante que não devia ser desprezado. Bingo! Foi eleito.

Uma vez na prefeitura, Doria começou a fazer exatamente aquilo que alguém faz quando compra uma padaria, um açougue ou qualquer outro negócio: coloca uma faixa de “SOB NOVA DIREÇÃO”, simbolizada nos adesivos de “CIDADE LINDA” e tratou de pintar a fachada do estabelecimento, cheia de pichações, varrer e lavar tudo.

Isso deu muita visibilidade ao estabelecimento e ao seu novo gerente. Ações de marketing que impactaram.

Porém, Doria se deparou com aquilo que ele considerou tralhas e que estavam num setor pouco utilizado do estabelecimento só para atrapalhar e enfeiar: os dependentes químicos. E ele queria muito passar a ganhar mais dinheiro com esse setor.

Então o gestor resolveu começar uma reforma mesmo sem antes ter tirado a tralha e jogado fora.

A tralha então foi espalhada pelas calçadas e chamou a atenção dos vizinhos que começaram a reclamar.

A metáfora pode ser meio esquisita mas não é muito forçada.

A cidade de São Paulo não é uma padaria e não pode ser administrada como se fora.

A difícil questão dos dependentes químicos da Cracolândia já teve várias abordagens pelo poder público. Devemos lembrar que Gilberto Kassab criou a denominada Operação Sufoco, descrita pelo coordenador de políticas de drogas da cidade como uma tentativa de cortar o fornecimento de drogas aos usuários. O objetivo seria "causar "dor e sofrimento" o suficiente para forçá-los a procurar tratamento.

Antes dele, José Serra em sua curta passagem pela prefeitura, também tratou o problema como uma simples questão de polícia com resultados pífios.

Após tantos anos de falta de vontade política, chegamos ao Programa Braços Abertos de Fernando Haddad que, se não chegou a resolver o problema, conseguiu o feito de recuperar uma parte dos dependentes, tratando-os com a dignidade que precisavam para começar a mudar de vida.

Inspirado pelo sucesso de programas similares na Holanda e Canadá, os cerca de 400 participantes da Braços Abertos recebiam US $ 6,50 por dia em troca de quatro horas de trabalho na limpeza de parques e outros locais públicos. Todos recebiam ainda refeições regulares e habitação em hotéis locais.

Quem teve forças conseguiu sair da Cracolândia. Quem não teve voltou ou nem saiu.

Mas o programa foi encerrado por Doria que achou que demolindo hotéis na Cracolândia, mesmo com pessoas dentro, fechando bares que não tinham autorização de funcionamento sem aviso prévio e expulsando os dependentes com força policial, resolveria o problema.

Ledo engano. E ele, se fosse um homem preparado, não deveria errar.
Agora o gestor decide internar, usando um eufemismo, compulsoriamente os dependentes.

Para surpresa do alcaide, não há estabelecimentos com vagas suficientes para internação, o que só demonstra que ele trabalha sem planejamento algum.

Além disso, o que esperar de uma internação compulsória?

Serão os dependentes internados num estabelecimento, à semelhança dos antigos manicômios, destinados somente a retirar de circulação e da vista de todos pessoas, feias, sujas e miseráveis?

A isso chamamos higienização social e até mesmo eugenia.

Já vimos isso acontecer antes e os resultados não foram nada bons.

O pior de tudo é que Doria jamais mudará sua maneira de pensar e agir. Não nasceu pra coisa pública.

Doria é um estranho no ninho na prefeitura. Achou que administraria a cidade como se fosse uma de suas empresas. Não teve nem tato para demitir sua Secretária Soninha Francini. Sua vocação mesmo é ser empresário. Em suas empresas ele pode mandar e desmandar à vontade.

Mas na cidade de São Paulo, não.




segunda-feira, 8 de maio de 2017

Sobre o espetáculo de 10 de maio

Por Fernando Castilho



Moro não hesitará em apelar para o vale tudo, já que nas encaradas preliminares já desrespeitou inúmeras regras consubstanciadas na nossa Constituição Federal, no Código Penal e no Código de Ética da Magistratura, tudo sob os olhares complacentes do Supremo, aquele Supremo que Lula qualificou eufemisticamente como acovardado mas que se revela na verdade cúmplice do golpe, desde sempre.

Dia 10 próximo deve ocorrer o depoimento de Lula ao juiz Moro.

O que todo mundo sabe ficou revelado nas capas das revistas de final de semana que mostram Moro em contenda com Lula, o que é incompatível com o cargo de juiz. Pior é que ele ostenta as cores do PSDB, que sempre lhe caíram bem.

O que essas capas não revelam é que só o contendor Moro tem poder institucional para vencer a luta. Portanto, a luta é desigual, afinal Moro é Lutador e juiz ao mesmo tempo.

E Moro não hesitará em apelar para o vale tudo, já que nas encaradas preliminares já desrespeitou inúmeras regras consubstanciadas na nossa Constituição Federal, no Código Penal e no Código de Ética da Magistratura, tudo sob os olhares complacentes do Supremo, aquele Supremo que Lula qualificou eufemisticamente como acovardado mas que se revela na verdade cúmplice do golpe, desde sempre.

Há torcida dos dois lados.

A da direita quer a condenação de Lula mesmo sem provas. São, via de regra, pessoas desinteressadas do Estado de Direito, afeitas a pré julgamentos apressados, que subornam o guarda e são, por isso, hipócritas. E mais, não percebem que é ele, justamente Lula, disparado nas pesquisas para 2018, o único nome capaz de tirar o país dessa crise econômica e política, pelo seu poder de negociação com todos os setores. E que é Lula o único capaz de repor os direitos sociais que estão sendo subtraídos dos pobres de direita, inclusive.

A da esquerda, embora sempre haja um Psol a fazer o jogo da direita e uma Rede oportunista preocupada somente em eleger a fadinha, defende a Democracia e o Estado de Direito, conquistados a duras penas e exigem provas para que Lula seja condenado.

E tudo por causa de um apartamento tríplex que não é dele e que se fosse, teria condições de compra.

Tivemos que, com vergonha alheia, ler numa entrevista o decano ainda vivo da corrupção, Paulo Maluf, eterno ícone dos coxinhas, fazer chacota ao afirmar que o tríplex é apenas três Minha Casa Minha Vida em cima do outro!

Dia 10 de maio o país entra num Fla-Flu em que o juiz entra em campo para anular todas as faltas contra Lula, anular todos os pênaltis e ainda fazer gols.

Como se não bastasse, o juiz-boxeador ainda se dirige à torcida antes da luta para pedir que não compareçam ao ringue, certamente porque nessas ocasiões a torcida é sempre pelo mais prejudicado pelo juiz e pode fazer a diferença, até virando o jogo.

Além disso, sabemos do poder de articulação de palavras de Lula, como ficou demonstrado inúmeras vezes, embora saibamos que o depoimento vazará para a Globo que o editará da maneira que mais lhe convier para o Jornal Nacional.

Então, como vejo o próximo dia 10?

Não é somente o bom depoimento de Lula que está em jogo, mas muito mais do que isso, é parte do contra-golpe que iniciou no dia 28 passado.

É o início do fim do governo golpista e de suas tramoias para acabar com os direitos sociais dos brasileiros, conquistados a duras penas.

É o início da retomada da Democracia que nos foi suprimida.