segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Conversar com um fascista: um desafio

Por Rubens Casara




Este artigo foi publicado em 24 de outubro, portanto, mais de um mês antes de vir à tona a gravação da conversa do senador bandido, Dulcídio do Amaral. Casara fala justamente da ''naturalização com que direitos fundamentais são afastados e violados no Brasil...'' e ''ampliam as hipóteses de 'prisão em flagrante' em evidente violação aos limites semânticos da palavra 'flagrante' inscrita no texto Constitucional como limite ao exercício do poder'', exatamente o que vimos na prisão ultra-rápida de Dulcídio.

Vamos ao texto.





Em Adorno, a ignorância, a ausência de reflexão, a identificação de inimigos imaginários, a transformação dos acusadores em julgadores (e vice-versa) e a manipulação do discurso religioso são, dentre outros sintomas, apontados como típicos do pensamento autoritário.

Pensem, agora, na naturalização com que direitos fundamentais são afastados e violados no Brasil, na crença no uso da força (e do sistema penal) para resolver os mais variados problemas sociais, na demonização de um partido político (que, apesar de vários erros, e ao contrário de outros partidos apontados como “democráticos”, não aderiu aos projetos a seguir descritos), no prestígio novamente atribuído aos “juízes-inquisidores”, nos recentes linchamentos (inclusive virtuais), no número tanto de pessoas mortas por ação da polícia quanto de policiais mortos e nos projetos legislativos que:

a) relativizam a presunção de inocência;

b) ampliam as hipóteses de “prisão em flagrante” em evidente violação aos limites semânticos da palavra “flagrante” inscrita no texto Constitucional como limite ao exercício do poder;

c) criminalizam os movimentos sociais com a desculpa de prevenir “atos de terrorismo”;

d) impedem o fornecimento de “pílulas do dia seguinte” para profilaxia de gravidez decorrente de violência sexual e criminalizam médicos que dão informações para mulheres vítimas de violência sexual;

e) eliminam o princípio constitucional da gratuidade na educação pública, dentre outras aberrações jurídicas. Conclusão? Avança-se na escala do fascismo.

O fascismo recebeu seu nome na Itália, mas Mussolini nunca esteve sozinho. Diversos movimentos semelhantes surgiram no pós-guerra com a mesma receita que unia voluntarismo, pouca reflexão e violência contra seus inimigos.

Hoje, parece que há consenso de que existe(m) fascismo(s) para além do fenômeno italiano ou, ainda, que o fascismo é um amálgama de significantes, um “patrimônio” de teorias, valores, princípios, estratégias e práticas à disposição dos governantes ou de lideranças de ocasião (que podem, por exemplo, ser fabricadas pelos detentores do poder político ou econômico, em especial através dos meios de comunicação de massa), que disseminam o ódio contra o que existe para conquistar o poder e/ou impor suas concepções de mundo.

O fascismo possui inegavelmente uma ideologia: uma ideologia de negação. Nega-se tudo (as diferenças, as qualidades dos opositores, as conquistas históricas, a luta de classes, etc.), principalmente, o conhecimento e, em consequência, o diálogo capaz de superar a ausência de saber.

Os fascistas, como já foi dito, talvez não saibam o que querem, mas sabem bem o que não suportam. Não suportam a democracia, entendida como concretização dos direitos fundamentais de todos, como processo de educação para a liberdade e de limites ao exercício do poder.

Essa mistura de pouca reflexão (o fascismo, nesse particular, aproxima-se dos fundamentalismos, ambos marcados pela ode à ignorância) e recurso à força (como resposta preferencial para os mais variados problemas sociais) produz reflexos em toda a sociedade.

As práticas fascistas revelam uma desconfiança. O fascista desconfia do conhecimento, tem ódio de quem demonstra saber algo que afronte ou se revele capaz de abalar suas crenças. Ignorância e confusão pautam sua postura na sociedade.

O recurso a crenças irracionais ou anti-racionais, a criação de inimigos imaginários (a transformação do “diferente” em inimigo), a confusão entre acusação e julgamento (o acusador – aquele indivíduo que aponta o dedo e atribui responsabilidade – que se transforma em juiz e o juiz que se torna acusador – o inquisidor pós-moderno) são sintomas do fascismo que poderiam ser superados se o sujeito estivesse aberto ao saber, ao diálogo que revela diversos saberes.

Diante dos riscos do fascismo, o desafio é confrontar o fascista com aquilo que para ele é insuportável: o outro. O instrumento? O diálogo, na melhor tradição filosófica atribuída a Sócrates. Talvez esse seja o objetivo do diálogo proposto pela filósofa Marcia Tiburi em seu novo livro, que tive o prazer de apresentar (o prefácio é do sempre excelente Jean Wyllys).

Em "Como conversar com um fascista: reflexões sobre o cotidiano autoritário brasileiro" (Rio de janeiro: Saraiva, 2015), a autora resgata a política como experiência de linguagem, sempre presente na vida em comum, e investe nessa operação, que exige o encontro entre o “eu” e o “tu”, apresentada como fundamental à construção democrática.

De fato, a qualidade e a própria existência da forma democrática dependem da abertura ao diálogo, da construção de diálogos genuínos – que não se confundem com monólogos travestidos de diálogos – em que a individualidade e os interesses de cada pessoa não inviabilizam a construção de um projeto comum, de uma comunidade fundada na reciprocidade e no respeito à alteridade.

Ao tratar da personalidade autoritária, dos micro-fascismos do dia-a-dia, do consumismo da linguagem, da transformação de pessoas em objetos, da plastificação das relações, da idiotização de parcela da população, dentre outros fenômenos perceptíveis na sociedade brasileira, Marcia Tiburi sugere uma mudança de atitude do um-para-com-o-outro.

Nos diversos ensaios deste livro, a autora conduz o leitor para um processo de reflexão e descoberta dos valores democráticos, bem como desvela as contradições, os preconceitos e as práticas que caracterizam os movimentos autoritários em plena democracia formal.

Mas, não é só.

Ao propor que a experiência dialógica alcance também os fascistas, aqueles que se recusam a perceber e aceitar o outro em sua totalidade, Marcia Tiburi exerce a arte de resistir. Dialogar com um fascista, e sobre o fascismo, forçar uma relação com um sujeito incapaz de suportar a diferença inerente ao diálogo, é um ato de resistência.

Confrontar o fascista, desvelar sua ignorância, fornecer informação/conhecimento, levar esse interlocutor à contradição, desconstruindo suas certezas, forçando-o a admitir que seu conhecimento é limitado, fazem parte do empreendimento ético-político da autora, que faz neste livro uma aposta na potência do diálogo e na difusão do conhecimento como antídoto à tradição autoritária que condiciona o pensamento e a ação em terra brasilis.

O leitor, ao final, perceberá que não só o objetivo foi alcançado como também que a autora nos brindou com um texto delicioso, original, profundo sem ser pretensioso. Mais do que recomendada a leitura.



Rubens Casara é Doutor em Direito, Mestre em Ciências Penais, Juiz de Direito do TJ/RJ, Coordenador de Processo Penal da EMERJ e escreve a Coluna ContraCorrentes no site Justificando (http://justificando.com/), aos sábados, com Giane Alvares, Marcelo Semer, Marcio Sotelo Felippe e Patrick Mariano. 

sábado, 28 de novembro de 2015

Delcídio, um caso único de petista tucano preso

Por Fernando Castilho




Charge: Renato Aroeira

Fomos surpreendidos com uma gravação em que o senador Delcídio do Amaral explicava para o filho de Nestor Cerveró, Bernardo, sua estratégia ou plano para livrar o ex-diretor da Petrobras da cadeia.



Muito se falou e se comentou sobre a gravação da conversa do senador Delcídio do Amaral com o filho de Nestor Cerveró. Tentarei aqui uma visão mais abrangente do caso.

O Senador Delcídio do Amaral é o que se pode chamar de um petista pirata: parece petista mas foi construído como tucano.

Não é exagero nem forçação de barra para defender petista.

Registra a História que Delcídio foi diretor de Gás e Energia da Petrobrás, entre 2000 e 2001, quando trabalhou com Nestor Cerveró e Paulo Roberto Costa, dois dos delatores da Operação Lava Jato. Portanto, a quadrilha começou a ser montada no governo FHC, o que deveria obrigar o juiz Sérgio Moro, por dever de ofício, estender as investigações àquela época pois veem ao caso.

Em 2002 Delcídio elegeu-se senador já pelo PT. Mais tarde, já no governo Dilma, passou a ser líder do governo no Senado e no Congresso.

Um grande erro.

Delcídio já sofria muitas restrições dentro do partido uma vez que suas ligações com José Serra o posicionavam como uma espécie de quinta coluna destinada a cravar uma mudança na legislação do pré-sal para beneficiar a Chevron americana.

A gravação divulgada em 26 de novembro revelou uma outra face de Delcídio. Uma face secreta. Uma face corrupta. Uma face habituada a se fazer valer pelo seu cargo num país em que todos os outros são trouxas. Uma face soturna que se reúne com pessoas na calada da noite para tramar atos inomináveis.

Delcídio teve a ousadia de se reunir com Bernardo Cerveró, filho de Nestor, para oferecer seus serviços de senador para livrar o ex-diretor da Petrobras da cadeia de Moro.

Afirmou com extrema naturalidade que falaria com os ministros do STF, Teori Zavascki, Dias Toffoli e Edson Fachin a fim de obter um habeas corpus para Cerveró. Os escalados para conversar com Gilmar Mendes seriam Michel Temer e Renan Calheiros. Pelo tom da conversa, isso seria muito tranquilo, sem problemas.

A intenção era a de soltar Cerveró para que este fugisse para a Espanha a bordo de um avião Falcon de propriedade do banqueiro André Esteves, do banco BTG Pactual.

O áudio da conversa teria sido gravado por Bernardo Cerveró, que não o entregou imediatamente ao STF. Alguns dias se passaram até que os ministros se manifestassem pela prisão de Delcídio e de Esteves.

Aí sobram algumas indagações ainda sem resposta:

Delcídio, Temer e Renan conversaram com os ministros?

O que aconteceu durante esses dias? A ''fita'' ficou na gaveta?

Houve negociação de algum tipo?

Existem outros áudios?

O áudio foi editado para suprimir outras falas inconvenientes ou está no original?

O que será feito dos senadores Romário e José Serra, também citados no áudio?

Quem é o japonês bonzinho que faz os vazamentos?  Essa é fácil.

Após esse hiato de alguns dias, alguns sites divulgaram que Teori convocou às pressas todos os ministros para uma reunião. Especulava-se uma bomba.

E ela explodiu.

Delcídio e Esteves foram presos em flagrante. Flagrante que não existiu pois já se haviam passado mais de 24 horas após a gravação.

Outro erro foi avalizar a gravação como autêntica sem passar antes pela perícia.

Consultado por este blogueiro, Pedro Estevam Serrano, professor de Direito Constitucional da PUC-SP, afirmou que as prisões foram inconstitucionais pois flagrante permanente de crime de organização criminosa e perturbação do processo [da Lava Jato] é forçar muito a barra.

Além das considerações de ordem jurídica que apontam para o desrespeito à Constituição por parte dos ministros do STF que deveriam zelar pelo seu cumprimento, para nós, leigos, fica a imensa estranheza da prisão ultra-rápida de um senador enquanto o presidente da Câmara, Eduardo Cunha se mantém solto há já um mês.

Causa estranheza também o fato de André Esteves ter obtido cópia dos autos para que seus advogados pudessem fazer sua defesa, já que até o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo em meses passados fez pedido formal para leitura de processos sem lograr êxito.

Mais estranheza causa ainda a reação de indignação dos ministros do STF ao tomarem conhecimento do vazamento, coisa que ocorre corriqueiramente à mídia quando se trata de algum petista envolvido.

De qualquer forma foi ótimo que todo esse imbróglio tenha acontecido e divulgado.

Sabemos que Delcídio do Amaral, mas muito provavelmente também outros congressistas, se valem de conversas secretas em hotéis que podem estar sendo gravadas ou não, para que se obtenham vantagens.

A corrupção não descansa. Ela não dorme à noite como nós, simples mortais, e às vezes, para tentar consertar um erro, cria-se outro.

Delcídio temia que seu nome fosse delatado por Nestor Cerveró. Acabou metendo os pés pelas mãos. A emenda foi pior que o soneto.

Sabemos também que os ministros do Supremo não são incólumes ao jogo político como querem nos fazer acreditar.

Delcídio está prestes a bater um recorde no que tange à sua cassação pelo Conselho de Ética, aquele mesmo que poupará Eduardo Cunha.

Cunha está até agora livre porque ameaçou carregar mais gente com ele e provavelmente não está blefando.

Dizem que antes ou depois da cassação, Delcídio poderá entregar alguns outros nomes, mas duvido pois o conluio é de grande extensão e vozes mais altas haverão de calá-lo. Não sairá atirando, não é Cunha, penso eu.

O momento de passar o Brasil a limpo deveria ser este, mas perderemos o bonde da oportunidade pois tanto o juiz Sérgio Moro de Curitiba, quanto o STF continuarão na sua tarefa hercúlea de punir seletivamente os corruptos deste país.

E estejamos certos de que, se Dilma não for derrubada agora e se não fizer seu sucessor, as quadrilhas voltarão com força total. Todo mundo que não seja político do PT será solto e todos os processos serão engavetados.

Se já não se pode confiar no Supremo Tribunal Federal que deveria ser o órgão máximo de defesa da Constituição, quem poderá nos salvar?









quinta-feira, 26 de novembro de 2015

A Argentina é o Brasil num universo paralelo?

Por Fernando Castilho


Para uma corrente de cientistas nosso universo pode não ser uno, mas sim multi. Vários universos coexistindo paralelamente poderiam teoricamente comportar acontecimentos parecidos com o que ocorrem no nossos, porém com possíveis diferenças de tempo e de desenrolar da História.

Muitas são as semelhanças do momento político de Brasil e Argentina. Muitas são as diferenças também.

Maurício Macri é o Aécio Neves que deu certo num universo paralelo?





A eleição de Maurício Macri, candidato da direita por margem apertada contra Daniel Scioli, candidato do governo de Cristina Kirchner, interrompe 12 anos de kirchnerismo.
Como no Brasil, o governo argentino desde 2003 realizou obras importantes no sentido de melhorar a vida do povo. Reduziu a pobreza, ampliou o mercado doméstico, reestatizou empresas que haviam sido privatizadas por Calos Menem, atuou na integração latino-americana, reduziu sua dependência em relação aos EUA, investiu na Unasul, reviu a lei que anistiava os crimes contra os Direitos Humanos praticados durante a ditadura militar, ampliou a tributação dos mais ricos e aprovou a Ley de Medios.

Como no Brasil, também, a nova classe que emergiu passou a exigir mais do governo.

Imediatamente surgiu um candidato neoliberal afoito em acabar com tudo isso que está aí, mas sem propostas concretas para o país. Macri é o Aécio Neves hermano.

Porém, se Aécio foi derrotado no Brasil, Macri, após uma reviravolta sensacional no segundo turno, venceu na Argentina.

A Dilma de lá não conseguiu eleger seu poste, Daniel Scioli.

Homem sem expressão, sem carisma e aparentemente sem a garra necessária para vencer, ou talvez deixando de se empenhar por achar que a vitória seria fácil, Scioli, mesmo sem aguardar o último voto, cumprimentou Macri pela vitória, cravando assim importante diferença em relação ao candidato derrotado no Brasil.

Macri então se torna uma nova e importante cabeça de ponte da direita na América Latina, além de Peru, Chile, Colômbia e México.

Tentará espalhar seu neoliberalismo. E já começou, mesmo sem ainda ter assumido, ao declarar que a Venezuela deverá deixar o Mercosul.

Já colocando as manguinhas de fora, o jornal La Nacion publicou um editorial em que defendeu a revisão de penas aos ditadores e torcionários do regime militar de 1976-83. Os jornalistas do próprio jornal repudiaram o editorial. Isso demonstra o que serão os próximos 4 anos na Argentina.

Na esteira desse editorial, os jornais deverão solicitar a Macri que elabore projeto anulando a Ley de Medios. E ele deverá atendê-los.

A Venezuela poderá em breve também dar sua guinada em direção à direita, quando se realizar seu próximo pleito.

A retomada da América Latina pela direita é estratégica para os Estados Unidos que investem cada vez mais na derrubada dos governos de esquerda, seja através de financiamentos a candidatos neoliberais, seja através da grande mídia ou ainda através do uso de redes sociais e de movimentos pró impeachment e pró golpe.

O PT pode se dar por feliz por ter vencido em 2014, mesmo por margem apertada. Dilma se segura ainda no governo e pode conduzi-lo aos trancos e barrancos até 2018.

Mas se seu candidato a sucessor for um Scioli, nada feito.

A lição veio então da Argentina e o PT tem muito a aprender com ela.

Se a Polícia Federal, o Ministério Público, O STF e a mídia não lograrem prender Lula até lá, só ele terá condições de prosseguir no projeto progressista para o Brasil.

Para o PT, mais uma vantagem: a presidente chilena Michelle Bachelet teve seu candidato Eduardo Frei derrotado em 2010 por um direitista como Macri, Sebastian Piñera.

Em 2014, diante do fracasso do governo neoliberal, o povo percebeu que era feliz e não sabia e elegeu novamente Bachelet.

Até 2018 a Argentina deverá mostrar ao Brasil que o neoliberalismo não melhorou o país.

Bastará então mostrar isso ao eleitorado brasileiro.




sábado, 21 de novembro de 2015

A lição que os estudantes estão dando a Alckmin

Por Fernando Castilho
Charge: Vítor Teixeira



O governo federal recebeu muitas críticas após ter escolhido o tema ''Pátria Educadora'' como lema ou missão para 2015.

''Quer esconder o descaso com a educação'', bradaram alguns.

''Dilma é demagoga'', gritaram outros.

Outros ainda classificaram a presidente de hipócrita, uma vez que a educação parece que não avança no país.

Realmente, poderia estar muito melhor.

Mas será que Dilma arca sozinha com a responsabilidade?

Quantos desconhecem que o governo federal repassa verba para os estados e municípios administrarem as escolas estaduais e municipais?

Quantos não sabem que em 2002 o orçamento federal para a educação foi só de 17 bilhões, em 2014 cresceu para 94 bilhões e em 2015 atingiu 101 bilhões de reais?

Ah, mas cortaram esse orçamento!

Ok, o corte foi de 1 bilhão, é verdade. Mesmo assim, 100 bilhões!

Folha de São Paulo noticiou o corte com sua costumeira maneira de mostrar e omitir de acordo com o que lhe interessa. Não esclareceu na matéria o montante do orçamento, só o corte.

Bem, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, manteve para 2015 os mesmos 28,4 bilhões de reais, ''esquecendo-se'' que a inflação no período foi de 7%, o que deveria resultar em 30,4 bilhões. Na prática, cortou 2 bilhões de reais na educação! A mídia não deu um pio, para variar.

Além disso, seu projeto de ''reorganização'' e fechamento de 94 escolas sem que houvesse diálogo com a população envolvida, demonstrou, além de autoritarismo, descaso com a educação.

São Paulo definitivamente não é um estado educador.

No momento em que escrevo, 85 escolas foram ocupadas por seus alunos.

Trinta dessas escolas apresentam, segundo o Estadão, desempenho acima da média, o que dá a dimensão da irresponsabilidade do governador.

A mídia trata o assunto como invasão, esquecendo-se que invasões são ações executadas por entes externos a um território e nunca pertencentes a ele.

Alunos de escolas públicas são legítimos ocupantes desse espaço público. Cabe a eles utilizá-lo na forma para o qual foi criado e zelar por ele. Defender esse espaço público contra agressões também se inclui aos seus deveres.

Nesse período de quase duas semanas em que as ocupações foram começando e chegaram a este espantoso número, fomos todos surpreendidos pela atitude tomada por esses estudantes na maioria pobres sem condição de pagar uma escola particular que possa facilitar seu ingresso numa faculdade.

Esses meninos e meninas, com estilo próprio de sua juventude, numa ação cívica defendem suas escolas contra a invasão da polícia truculenta de Alckmin que quer tirá-los à força. Demonstrações de violência por parte da polícia contra estudantes e professores já aconteceram, sempre ocultadas pela mídia. Típico modus operandi de governadores tucanos, vide Beto Richa no Paraná.

Alckmin já tentou até reintegração na posse, mas a justiça não concedeu é claro. Reintegrar na posse só se aplica em casos em que o bem público é invadido, o que não é o caso, como vimos acima.

Os alunos limpam os pátios e salas de aula, cozinham alimentos doados por várias entidades, inclusive o MST com seus orgânicos, fazem vídeos para o youtube, aprendendo a se expressar melhor oralmente, realizam reuniões e assembleias, etc..

O tiro de Geraldo Alckmin acaba saindo pela culatra.

Se uma das intenções era de sucatear o ensino público para entregá-lo de bandeja para a iniciativa privada, o governador conseguiu somente que os estudantes aprendessem em apenas duas semanas o conteúdo de um ano inteiro ou mais de Sociologia.

Nossos estudantes agora também são mestres em cidadania, solidariedade e organização.

Aprendem também a prática democrática de votar decisões e acatá-las.

A lição de vida que estão tendo vale muito mais que qualquer trabalho acadêmico feito burocraticamente só para tirar nota e passar de ano.

Indiretamente, graças ao governador de São Paulo, surge uma nova geração que saberá, já nas próximas eleições, escolher seus governantes e representantes com mais consciência política e dar o troco na hora certa.

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Como Aécio sem querer inviabilizou o golpe

Por Fernando Castilho




Repararam? Claro que sim.

A mídia parou de falar em impeachment de Dilma.

Forçados por ela, mas também pelos empresários, leia-se aí a Fiesp e a Fierj, os tucanos de Aécio Neves desistiram de impedir a presidente. Pior, foram forçados a parar de inviabilizar o país e passar a colaborar para que a crise econômica seja superada

Além disso, devem ter em mãos algum tipo de avaliação da população sobre seu comportamento patético até agora.

Pesquisa recente do Ibope, espalhafatosamente divulgada em manchetes pela mídia indicou que, para as eleições de 2018, Lula é o recordista em rejeição com 55%. Claro, com os ataques diários que passou a sofrer depois que os jornais desistiram de Dilma, não é nenhuma surpresa.

Mas para Aécio, a rejeição de 47%, depois de tudo o que ele fez pela queda da presidente, deve ter caído como uma bomba.

Pior, quando o leitor se aprofunda um pouco mais, indo além das manchetes, descobre o que os jornais tentaram esconder, ou seja, que Lula tem 23% da preferência do eleitorado enquanto que o tucano ostenta somente 15%, depois-de-tudo-o-que-ele-fez-pela-queda-da-presidente.

Os tucanos desistiram de derrubar Dilma?

Não, mas o sonho está cada vez mais distante e depende de um golpe que o TSE possa dar ao cassar sua candidatura, o que também é um tanto improvável.

Hélio Bicudo e Miguel Reale Júnior acabaram por manchar suas biografias ao elaborarem pareceres jurídicos frágeis e apaixonados a favor do impeachment, que não se sustentam, na opinião de outros próceres como Dalmo Dallari e Celso Antônio Bandeira de Mello.

Paralelamente a isso, a revelação bombástica sobre as contas secretas na Suíça do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, explicitou à uma gente que babava pelo impeachment, que o protesto pela sujeira estava com o foco errado. Fora que o homem vai se aguentando no cargo já há mais de um mês sem que mexam com ele. Impunidade é outro ponto nevrálgico se quisermos passar o Brasil a limpo.

Então, o que foi feito daquela gente branca-verde-amarela que saiu às ruas em março? 200 mil pessoas, segundo o Datafolha?

Perderam a esperança nos tucanos e em seu líder no golpismo, Aécio Neves.
Depois de tantas decepções, que se atreveria ainda a defender esse golpe?

Em 15 de novembro os grupos de revoltados online, MBL do Kim e outros, organizaram o que seria a manifestação de arromba na esplanada dos ministérios em Brasília. Dilma cairia naquele dia mesmo.

Mas quem compareceu? Cerca de 2000 pessoas.

Onde estavam os pró impeachment? Não foram. Já estão em outra.

Os doidos que se deslocaram pra lá estavam exigindo a volta da ditadura militar. Só sobraram eles, praticamente.

Queriam a volta de um regime que não permitia manifestações contra o governo. Pior, um regime que na época mandava o exército prender, torturar e matar quem se opunha ao regime como eles estavam fazendo.

A Polícia Militar do Distrito Federal já havia sido colocada em prontidão depois que foi descoberto um arsenal de armas brancas e uma arma de fogo no carro de um membro do MBL acampado no terreno do Congresso.

Foi também por esse motivo que a PM, responsável pela manutenção da segurança no local, teve que intervir depois que os manifestantes ameaçaram invadir o Congresso.
Foram usados sprays de pimenta, mas a repressão foi bem light se comparada aos tempos difíceis.

Foi engraçado ver aqueles patetas fugindo dos militares, como naquele tempo.

Como se não bastasse, acusaram a PM de truculência e violência, típicos do regime-comunista-de-Dilma que não permitiu que eles protestassem democraticamente exigindo a ditadura.

Mais loucura coletiva que isso não deve haver.

Bem, mas se dependemos de um bando de loucos para que uma presidente eleita seja derrubada, estejamos seguros que ela ainda terá mais três anos de governo pela frente.

Precisa agora começar a governar de fato, sem que sabotadores estejam em seus calcanhares.

E a Aécio resta agora tentar superar sua imagem desgastada por tantas pataquadas. A citar, a auditoria no TSE acerca do processo eleitoral que o avalizou, a viagem a Venezuela para tentar entrevistar um preso político, que não deu em nada, o parecer jurídico frágil pelo impeachment, a forçada apeada do impeachment, a retirada a contragosto do apoio à Eduardo Cunha e o amargo segundo lugar na preferência para 2018.

Pode-se, portanto, imputar a ele o fracasso do golpe.

Deve ser por isso que ele está fazendo uma espécie de retiro nas últimas semanas.

Deve rever seus conceitos, se quiser chegar com alguma reputação a 2018.




sábado, 14 de novembro de 2015

É possível um elo entre Mariana e Paris?

Por Fernando Castilho





Quando cheguei a uma certa idade comecei a fazer uma retrospectiva histórica, filosófica e sociológica do Brasil e do mundo, mais detidamente durante as décadas que vivi.

Óbvio, para mim, pelo menos, que principalmente a partir do fim da 2° guerra mundial, com a disputa pela hegemonia no poder por Estados Unidos e União Soviética, o mundo começou a mudar e se tornar no que é hoje.

Os Estados Unidos ao urgirem se impor ao bloco soviético, foram às últimas consequências para demonstrar que o sonho americano, o american way of life, o país livre, eram muito superiores ao que o comunismo pregava.

E realmente eram. Pelo menos do jeito que as coisas estavam acontecendo.

A publicidade extrapolou todos os limites ao explicitar ao bloco ocidental que se as pessoas não consumissem sem parar, não contribuiriam para a manutenção do sistema.

A exploração de recursos naturais se impôs, uma vez que havia a necessidade de suprir a indústria de matéria-prima.

A proliferação de produtos eletro-eletrônicos exigiu a construção de mais e mais usinas, sejam elas hidrelétricas, que destroem o meio ambiente ao redor, sejam elas termoelétricas, que poluem a atmosfera, ou nucleares que podem causar grande contaminação, como Chernobyl ou Fukushima.

A obsolescência programada pelas empresas fez com que as pessoas trocassem seus produtos por outros assim que modelos novos fossem sendo lançados ou assim que os ''antigos'' com mais de um ano de fabricação começassem a quebrar sem que o conserto fosse a opção mais econômica.

A Educação deixou de priorizar a produção de conhecimento, a pesquisa científica e o pensamento intelectual. Criou-se um funil destinado a selecionar somente aqueles que fossem capazes de serem úteis à manutenção do sistema. Aqueles que jamais perderiam seu tempo em reflexões acerca das conjunturas humanas, sociológicas, econômicas, filosóficas ou históricas, mas sim, o canalizariam em 100% para o crescimento das empresas em que trabalham.

Afinal, era prioritário que eles galgassem cargos mais altos nas empresas.

Aqueles que não passavam no funil ou que nem mesmo a chance tiveram de passar por ele, eram obrigados a viverem suas vidas também de forma a alimentar o sistema, mas de outra forma. Seriam a mão de obra mais pesada das empresas e galgariam postos sempre inferiores.

Outros seriam excluídos totalmente por terem nascido em lares muito pobres e desestruturados, não tendo a chance sequer de pensar em entrar para o sistema. São os miseráveis hereditários do mundo, que nem sabem por quê estão aqui. Muitos não veem outra opção para sobreviver senão entrar para o crime, que pode lhes garantir, pelo menos por algum tempo, a ilusão de como os do andar de cima vivem.

A guerra fria acabou mas o american way of life prosseguiu em cavar o mundo cada vez mais avidamente, afinal, para alimentar o sistema e aumentar os lucros era imperativo extrair dele o máximo que se pudesse.
Marx previu tudo isso e mais, mas não vamos falar dele sob pena de que o texto seja acusado de comunista, muito em voga nos dias de hoje, certo?

Chegamos aos dias de hoje em que 1% da população mundial detém 50% de toda riqueza.

Como riqueza não se cria, apenas se transfere (numa adaptação livre de Lavoisier), não há como melhorar a vida dos restantes 99% sem melhorar a distribuição dessa riqueza. Mas esquece, isso não será feito. Thomas Piketty falou sobre isso em seu livro ''O capital no século 21 ''.

Então o sistema criou uma casta de deuses que domina o mundo e uma multidão de simples fieis. Alguns não serão fieis como se verá adiante.

Para aumentar os lucros os deuses tudo podem.

Pausa para uma estória verídica.

Na década de 1970 a Ford americana lançou um automóvel chamado Ford Pinto, alguém se lembra?

Pois bem, o Ford Pinto tinha um erro de projeto. O tanque de combustível fora colocado atrás, muito próximo ao para-choques, o que fazia com que a cada colisão traseira, o tanque explodisse matando ou mutilando seus ocupantes.

A Ford foi processada por alguns familiares de vítimas.

Durante o julgamento, apareceu um memorando interno dando conta de um cálculo que a empresa fez.

Nesse cálculo estimava-se que o custo para reparar o erro seria de 11 dólares por veículo.

A Ford estimou que, caso um certo número de vítimas a processasse e ganhasse, ainda assim seria mais barato manter o carro do mesmo jeito.

Chegamos a um ponto na História da humanidade em que a busca do lucro se sobrepõe facilmente à vida.

Por décadas esse sistema se infiltrou no nosso DNA, de forma que contestá-lo se torna heresia nos dias de hoje.

Ao que tudo indica, vamos até o fim com ele, como o sapo que morrw ao ser cozido lentamente na panela, quando teve oportunidade de sair.

Sinto tristeza em ver que o mundo ocidental foi tomado por essa ideologia da qual não consegue escapar.

Tudo isso que foi escrito se destina a tentar explicar os acontecimentos de Mariana e de Paris.

Mariana

Em Mariana, subdistrito de Bento Rodrigues, o que aconteceu foi uma busca incessante por lucros em detrimento da segurança.

Burlas em laudos técnicos, fraudes, corrupção de agentes vistores e de governadores, tudo isso faz parte da rotina de uma grande empresa que só se preocupa com lucros.

Nenhuma barragem, obra de engenharia que deve ser bastante segura em seu projeto, se rompe da noite para o dia sem dar sinais antes.

Os sinais podem ter sido vários, desde fissuras no concreto até estalos bem altos.

A tragédia foi anunciada em nome de se obter maiores lucros pois a interrupção de funcionamento para reparos e manutenção teria custos.

Indo para Paris

Em 2013 apareceu um grupo com pretensões a derrubar o regime de Bashar al-Assad, presidente da Síria. Barack Obama rapidamente, informado pela CIA, enxergou a possibilidade de ajudar o grupo na defenestração de Bashar para pretensamente colaborar para a instauração de um governo democrático no país que lhe possibilitasse usufruir do petróleo ali existente.

Para não dar na vista, Obama divulgou à mídia que iria combater o EI. Pelo contrário, as armas que o grupo emprega são de fabricação norte-americana.

O grupo só se fez crescer.

Quem se agregou ao grupo? Sim, os excluídos de vários países do mundo que viram em sua adesão ao EI uma oportunidade de fazer alguma coisa de suas vidas sem espaço no sistema em que vivem.

Vimos ingleses, franceses a até americanos ingressarem voluntariamente no EI.

A Rússia decidiu intervir e vem abrindo baixas significativas no EI. Obama não gostou.

Provavelmente em pouco tempo a Rússia consiga acabar com o Estado Islâmico.

O que aconteceu em Paris talvez seja um canto de cisne para o grupo.

Porém, o que aprendemos das lições passadas nos últimos dias?

Nada.

O mundo continuará a prosseguir na mesma trilha equivocada em que está, a fraternidade universal não será alcançada, o Papa Francisco poderá ser morto a qualquer momento, outros ''acidentes'' ambientais ocorrerão, novos grupos de excluídos e inconformados surgirão e a humanidade está com seus dias, talvez décadas, contadas.

Alguém acha que sou muito pessimista, ou apenas realista?

Não há a mínima possibilidade de mudança.

Os deuses são como aquelas pessoas que tem carros blindados e que vivem em condomínios cercados por segurança extrema.

Desde que tenham sua própria segurança, que acabe o mundo ao seu redor.

Abre-se mais uma champanhe.


sexta-feira, 13 de novembro de 2015

''A ESCOLA É NOSSA!''

Por Walter Takemoto


Este texto de Walter Takemoto dá bem uma ideia da situação que o ensino público em São Paulo está vivendo.

Os tão sofridos alunos das escolas públicas do Estado de São Paulo estão sofrendo uma dor que não pode ser sofrida nessa fase da vida.

Quando vejo uma foto como a que ilustra este texto, sinto arrepios. Estudantes da escola pública defendendo sua escola e bradando: ''A ESCOLA É NOSSA!''

O governador Geraldo Alckmin, que só sabe usar de truculência e autoritarismo não pode tirar desses jovens o mínimo que eles têm, o direito de estudar, mesmo sem as condições que as escolas particulares oferecem aos que vêm de classes mais abastadas.


Só espero que, passado este pesadelo, a experiência adquirida por essa resistência que alguns jovens estão oferecendo ao projeto de Alckmin, sirvam para torná-los cidadãos cônscios de seus direitos e deveres, afinal, há males que vêm para bem.


O governo do Estado de São Paulo decidiu reorganizar a rede estadual de escolas do estado. Em nome da racionalização, da contenção de despesas e de uma discutível política educacional, decidiu fechar parte das escolas em um processo claramente autoritário, desconsiderando os profissionais da educação e os estudantes.

A partir do anúncio público, professores, estudantes e pais realizaram várias manifestações na capital e cidades do interior, contra a medida e exigindo a abertura de negociações. E mais uma vez o governador respondeu com o mesmo método que utilizou em outros momentos: a truculência da Polícia Militar contra professores e estudantes. Professores e adolescentes algemados, gás de pimenta, agressões físicas.

Nesse momento, estudantes estão ocupando escolas que o governador decidiu fechar. E para enfrentar o perigo grave de estudantes ocupando uma escola, o governador determinou o corte do fornecimento de água, o cerco pela Polícia Militar e ingressou na Justiça com pedido de reintegração de posse. Afinal, para o Alckmin, a escola é dele, não é dos professores, estudantes e da população. E fica uma pergunta: se a justiça conceder a reintegração de posse, o governador vai mandar a tropa de choque invadir a escola e prender todos que nela estiverem?

E essa mobilização dos estudantes das escolas públicas de São Paulo me fez refletir sobre a função social da escola.

Alguns anos atrás, trabalhando no Acre, me deparei com uma notícia que relatava a presença de estudantes do ensino médio de uma escola privada de São Paulo, dessas que ocupam os primeiros lugares no ENEM, que estavam em Xapuri conhecendo os seringais e a vida do Chico Mendes.

Para os filhos da elite, não basta estudar em livros, assistir filmes, é preciso ir a campo, conhecer presencialmente, vivenciar a realidade. Afinal, estão sendo formados para dirigir corporações, comandar pessoas, tomar decisões, dirigir os rumos do País.

Enquanto isso, nas escolas públicas, falta até mesmo os livros, as salas de vídeo, um ônibus que possa levar alunos da periferia para um museu, centro cultural ou qualquer atividade fora das salas de aula.

Afinal, estudantes de escolas públicas na imensa maioria serão trabalhadores, irão obedecer, cumprir ordens, terão subempregos, serão a mão de obra disponível quando for necessário.

Para esses, basta o livro didático ou o pacote educacional que os treinarão até onde interessa que aprendam, no retorno da velha discussão de décadas atrás de que servirão para apertar botões, ligar e desligar máquinas, e hoje podemos dizer que no máximo saber utilizar aplicativos produzidos pela Microsoft.

Mas os meninos e as meninas das escolas públicas de São Paulo, como volta e meia acontece, resolveram mudar o roteiro escrito pelo Alckmin.

E novamente, quando muitos pensavam que o famoso ME, ou movimento estudantil, tinha sido domesticado, ou burocratizado, de uma vez por todas, surge novamente o vigor e a ousadia adolescente pelas ruas e avenidas. E novamente sentimos florescer o mito do poder jovem nos gritos, mãos e sorrisos dessas meninas e meninos.

Que a imaginação e o sonho algum dia cheguem ao poder.

Coração de estudante
Há que se cuidar da vida
Há que se cuidar do mundo
Tomar conta da amizade
Alegria e muito sonho
Espalhados no caminho
Verdes, plantas, sentimento
Folhas, coração, juventude e fé”

quinta-feira, 12 de novembro de 2015

O picolé autoritário

Por Fernando Castilho


Foto: IstoÉ




O que se passa na cabeça do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, que após 16 anos cultivando a alcunha de ''picolé de chuchu'' pelo seu imobilismo, resolve mudar, adotando o estilo truculento?



Dos 20 anos de tucanato, Geraldo Alckmin ostenta, entre vice de Mário Covas e governador de São Paulo, incríveis 17 anos à frente do Executivo Estadual.

Nos tempos de Covas, Alckmin pouco se sobressaiu devido à personalidade forte do governador.

Após o falecimento de Covas, Alckmin assumiu o governo recebendo em pouco tempo a alcunha de ''picolé de chuchu'', uma vez que era figura apagada.

Essas figuras apagadas são interessantes. Se você não quer sofrer nenhuma crítica, não deseja se envolver em polêmicas, você simplesmente...não faz!

Geraldo Alckmin seguiu à risca essa cartilha até 2014. Os problemas do Estado de São Paulo pela inação do governo se avolumaram.

O Metrô estava estagnado há anos, o que acarretava estações e trens superlotados.

O escândalo do tremsalão, embora blindado pela mídia, era alvo de investigações inclusive na Suíça.

A crise hídrica por omissão do governador que não criou novos reservatórios, apesar de ter se comprometido à isso durante a assinatura da outorga, estourou. Ao racionamento de água Alckmin deu outro nome eufemístico: restrição hídrica.

A Polícia Militar matava cada vez mais, demonstrando que não havia um plano de segurança pública.

A USP estava em greve devido ao sucateamento imposto pelo governo.

Os pedágios eram os mais caros do país contribuindo em muito para o encarecimento dos produtos e para a inflação nacional.

Nesse ano de 2014, quando se esperava que o povo paulista desejasse que a outrora locomotiva do Brasil que estava estacionada há tanto tento tempo, começasse a queimar carvão e a se movimentar, veio a decepção. Alckmin se reelegeu em primeiro turno, o que demonstrou claramente que a população queria mais do mesmo.

Começou o ano de 2015 e percebemos que Geraldo começou a se mover, enfim.

Mas seu movimento nunca foi no sentido de começar a arrumar a casa que ele bagunçou por tanto tempo.

O Metrô continua do mesmo jeito. Pior, contratos foram cancelados, talvez por medo das investigações do tremsalão que envolvem também seu nome.

A crise hídrica não arrefeceu, mas num non sense total, o governador ganhou prêmio de Gestão Hídrica oferecido pela Assembleia Legislativa dominada pelos cupinchas tucanos.

A PM agora, não só matava como também chacinava pessoas, como em Osasco. Além disso, começou a bater em professores da rede estadual que estavam em greve.

Então o governador resolveu inovar, coisa que nunca foi de seu estilo.

Determinou sigilo de contratos do Metrô e de dados da Polícia Militar.

Mentiu em relatório sobre o número de mortos pela PM.

Inventou uma tal de reorganização das escolas estaduais (outro eufemismo para fechamento). Com isso, 94 colégios estão sendo fechados, vários deles com ótimo aproveitamento.

Fica evidente que há um plano em mente.

Possivelmente a terceirização do ensino público. Não se descarta também que colégios particulares estejam interessados em abocanhar fatias, uma vez que para muitos estudantes a mudança será muito prejudicial.

Então, estudantes secundaristas resolveram resistir e protestar.

A Escola Estadual Fernão Dias Paes Leme de Pinheiros, São Paulo, a Escola Estadual Salvador Allende Gossens na zona leste da capital e a Valdomiro Silveira de Santo André, foram ocupadas pelos estudantes secundaristas.

Alckmin imediatamente enviou a PM para a Fernão Dias Paes ao invés de dialogar e iniciar negociações.

Manifestantes contra a reorganização protestavam nas imediações da escola quando foram reprimidos pela PM com gás de pimenta!

Como os alunos do Fernão Dias Paes decidiram em assembleia passar a noite na escola, Alckmin mandou cortar a água! Além de pedir reintegração na posse, que poderá gerar confronto com a PM.

Bem, muito já foi dito sobre a nova postura que o governador tomou neste ano.

Autoritário, truculento, sem disposição ao diálogo, Geraldo Alckmin é pré candidato à presidência da República em 2018, talvez pelo PSB já que Aécio Neves não deve lhe oferecer a legenda que quer para ele próprio.

Mas, se todo político que almeja cargo tão alto procura se apresentar como simpático e popular, Alckmin vai no sentido contrário.

Mas a julgar pela pesquisa Datafolha que mostrou que metade dos paulistas apoia a reorganização e fechamento de escolas, o governador pode estar na direção certa para concretizar o seu sonho.

Numa tentativa de explicar o que se passa na cabeça do governador é preciso lembrar que o Estado de São Paulo, e mais notadamente sua capital, tem demonstrado durante todo este ano uma aproximação com o fascismo.

Demonstrações de intolerância, violência e preconceito de classe estão tomando conta de corações e mentes de muita gente.

Alckmin parece estar indo na contra-mão do prefeito Fernando Haddad que ostenta alta rejeição justamente entre essas pessoas de classe média.

Pode ser por isso que Alckmin esteja mirando nessa direção.

Como faltam 3 anos ainda para 2018, Geraldo pode estar lançando um balão de ensaio até que uma pesquisa eleitoral saia às ruas com muito tempo ainda para mudança de rumos, caso esteja errado.

Se a popularidade estiver em alta, podemos esperar mais autoritarismo e truculência pela frente. Ele vai surfar nessa onda.

Caso contrário, esperemos uma nova Madre Tereza, cínica.